sexta-feira, 12 de fevereiro de 2010

Crescem as oportunidades para os novos contadores

 Que um mais um é igual a dois, ou que cinco menos três também resulta em dois, a ampla maioria sabe. Difícil é aplicar estas e outras equações nas complexas planilhas da contabilidade das empresas, para controlar o caixa e prestar contas ao governo. Por isso, a figura do contador torna-se cada vez mais vital e bem remunerada no mundo empresarial. São pelo menos 380 mil em todo o país, cujos salários podem ir do piso de cerca de R$ 400 (para os assistentes de escritório, menos preparados) até entre R$ 15 mil e R$ 30 mil.

Antigamente, estes funcionários eram vistos como alguém sem criatividade e jogo de cintura, que apenas checavam a entrada e saída do patrimônio do patrão. Hoje, com a migração dos trabalhadores de carteira assinada para a prestação de serviços, o seu trabalho aumentou e passou a exigir outra postura. Atual aliado da informatização e da globalização, o contador também se tornou ativo, criativo, dinâmico e fundamental para micros, médios e grande empresários. Ele funciona quase como um gestor financeiro. Quem não acompanha estas mudanças fica no meio do caminho.

A origem desta profissão pode ser situada nos anos 500 a.C, quando Pitágoras criou as relações matemáticas. Mas o marco histórico da contabilidade é a obra Summa de Arithmetica, Geometrica, Proportioni et Proportionalita, de Frei Lucca Pacioli, publicada em Veneza em 1494. Um dos primeiros impressos no mundo, a obra descreve o método usado pelos mercadores de Veneza para controlar a suas operações de compra e venda. Mais tarde ela passou a ser denominada "partidas dobradas", como é conhecida até hoje.

"Regulamentada no Brasil em 1946, hoje a profissão evoluiu muito", afirma Irineu De Mula, vice-presidente técnico do Conselho Federal de Contabilidade, para quem a contabilidade em si é uma ciência e a forma de executá-la e organizá-la é uma arte. "Mas o método criado por Pacioli é usado até a atualidade e os seus princípios fundamentais são filosóficos, como a prudência e a valorização dos valores históricos".

Para José Maria Alcazar, diretor-presidente da Seteco Serviços Técnicos Contábeis e vice-presidente do Sindicato das Empresas de Serviços de Assessoria, Perícias, Pesquisa e Contabilidade do Estado de São Paulo (Sesconp), no Brasil a profissão teve alguns marcos durante o século XX. "O primeiro foi nos anos de 40, quando o contador era a um consultor conservador e uma espécie de assessor direto do presidente da empresa", avalia.

"Em seguida, com a automação industrial e comercial, as modificações nos sistemas administrativos e as exigências burocráticas do governo, ele virou uma espécie de intermediário entre a empresa e o governo. Era visto como uma pessoa rude e estressada." Hoje, segundo Alcazar, a situação mudou. "A evolução tecnológica e os tempos modernos obrigaram a uma mudança de perfil e o contador passou a ser consultor e conselheiro da organização das empresas, zelando pelos seus números estrategicamente e não mais apenas para controlar as guias".

A Seteco, fundada pelo próprio, é um exemplo disso. Ele a criou há 34 anos, quando se formou e casou com Kátia Ruiz, também contadora. Hoje, marido e mulher trabalham com os filhos Márcia, de 32 anos, Adriana, de 31 e Fernando, 24, que é formado em técnicas da informática. A família conta, ainda, com mais de 100 funcionários colaboradores.

"Nós formamos o conselho diretor, e eles são administradores-gerentes com autonomia operacional", conta Alcazar. Obedecendo aos novos tempos, o escritório mantém um site na internet e grande parte da comunicação com os seus 250 clientes, como a Fundação Abrinq e a empreendedora Coelho da Fonseca, é feita por e-mail. A empresa fatura cerca de R$ 4 milhões por ano.

Para Alcazar, tal fenômeno detecta-se da metade da década de 90 para cá. "Embora exista a ferramenta da tecnologia, atualmente este profissional precisa falar pelo menos três línguas (português, espanhol, inglês) e entender de capital estrangeiro, devido à globalização", explica. "E deve possuir dinamismo e raciocínio pois se tornou um assessor estratégico dos números da empresa."

O aspirante a esta promissora e hoje nada aborrecida profissão, deve escolher um curso de ciências contábeis em uma das mais de 100 faculdades de todo o país. Ele sairá formado em quatro anos, mas nem tudo é tão fácil neste setor. Para moralizar o mercado e se livrar de vez do estigma de "guardador de livros", o CFC aguarda a promulgação de um projeto que institui um exame de suficiência para quem quiser exercer a função a partir de agora. Parecido com a prova que os bacharéis de Direito realizam sob os auspícios da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) para adquirir o direito de advogar, o exame pretende dar mais credibilidade aos novos profissionais. Ele será aplicado pelos conselhos regionais de cada estado.

O CFC defende o exame com o argumento da formação fraca dos iniciantes. Mas um segundo mecanismo de controle profissional também está sendo discutido entre eles. É o exame de competência para quem já está no mercado há mais de cinco anos. Ele seria uma espécie de teste para avaliar se os profissionais vêm se atualizando na matéria e estão realmente preparados para continuar a exercer a função.

De Mula observa que dos quase 380 mil profissionais do setor no Brasil, apenas 120 mil são contadores com graduação universitária, capazes de realizar perícias e auditorias, além da contabilidade. "Estes são preparados para atuar na área mais nobre da profissão, que exige grande nível intelectual, e podem ganhar salários de R$ 15 mil e, em alguns casos da iniciativa privada, atingir tetos de R$ 30 mil", diz ele, que foi auditor da Price durante 38 anos, é aposentado há 4 e hoje atua na CFC e dá palestras pelo país. "O restante são técnicos em contabilidade" - cujas remunerações mal ultrapassam o piso."

Tadashi , sócio-administrador da Adconta Assessoria Contábil, empresa atuante no setor há 40 anos, também conclui que o contador moderno deve ter formação elevada. "Hoje, ele não atua nem em 5% da operação contábil do escritório", diz. "Pelo menos em 95% do trabalho, ele faz análises tributárias, legais, trabalhistas, compara índices, tira conclusões matemáticas e traça rotas para o cliente."

Como os seus colegas, no entanto, Weno considera que o mercado é bom, está em expansão e é bem remunerado, porém "90% dos recém-formados não tem competência para trabalhar nele ". Daí as exigências da classe.

Afinal, como observam eles, toda empresa precisa dos serviços de um contabilista - "do bazar à Volkswagen", nas palavras de De Mula. E o fenômeno do surgimento das empresas prestadoras de serviços, as terceirizadas, obedecendo a mudança de relações entre empregado e empregador, vem ampliar o mercado e exigir mais dedicação e competência do profissional.

"Não interessa o tamanho da organização, toda a parte burocrática e administrativa deve ser feita por um contador e com o mesmo zelo", conclui ele. "E o executivo e o trabalhador devem se concentrar na sua matéria."

(Valor Econômico – 11/02/04)

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